segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Uma empresa decidiu oferecer ônibus melhores e mais baratos. Este é o resultado.

            Logo abaixo de “educação” em termos de preocupação dos brasileiros segundo pesquisa do instituto Datafolha, “Transporte” ainda é um tema pouco debatido e em geral dominado pelo discurso político. Enquanto 1 em cada 4 paulistanos gastam mais de 30% do seu tempo de trabalho apenas para se locomover entre sua casa e o local de trabalho, e mais de R$ 100 bilhões (ou 2% do nosso PIB), são desperdiçados apenas com tempo perdido no trânsito, o prefeito da maior capital do país politiza o tema, e transforma a mobilidade urbana em um  ‘nós contra eles’.

            Ao mesmo tempo em que qualifica sua luta pessoal pela implementação de ciclovias como uma “luta contra a barbárie”, o prefeito de São Paulo segue fazendo pouco ou quase nada que mude as estruturas do setor de transporte público. Sua alternativa para serviços de transporte individual como o Uber por exemplo, é criar uma categoria especial de taxistas que utilizem carros pretos e paguem taxas que juntas poderiam chegar a R$ 60 mil, tudo para ofertar um serviço que funciona atualmente sendo testado e aprovado por consumidores diariamente.
            No campo do transporte coletivo, a maior cidade do país se prepara para licitar suas linhas de ônibus, em uma operação que pode reduzir em até 15% o número de ônibus em circulação, além de oferecer as empresas vencedoras lucro garantido de 9,97% e R$ 7 bilhões  em subsídios anualmente para manter o preço da passagem estável. Criar e manter monopólios no setor de transporte público porém, é uma prerrogativa de todas as prefeituras brasileiras, não apenas da capital paulista.
            Em cidades como Porto Alegre, por exemplo, que possui a segunda tarifa mais cara do país, além de ser a única capital a contar com uma empresa estatal de transporte, a Cia Carris, a licitação do transporte urbano esta emperrada há 30 anos. Durante todo este período o setor se manteve como um monopólio sem que o governo realizasse nenhum esforço para muda-lo. Preços de tarifas são definidos em gabinetes e acatados por toda a população com o mínimo necessário de transparência.
            O transporte coletivo nas capitais brasileiras é um caso conhecido de alinhamento entre poder político e econômico. Os reis do transporte coletivo no país ostentam dezenas de empresas, milhares de ônibus e um monopólio muito bem protegido pelos governos país afora. Proibir e reprimir vans e outros meios de transporte é uma prática comum, e como na nova licitação paulista, reduzir a oferta em um cenário de demanda constante é quase sempre a alternativa encontrada por empresas e governos para garantir um lucro crescente.
            O resultado de tamanho descaso são as constantes reclamações sobre o setor, do Rio Grande do Sul ao Amapá, o transporte é um problema que afeta diariamente milhões de brasileiros, em um cenário mais visível que a má qualidade de serviços como educação e saúde. Mas, e se uma empresa decidisse furar este bloqueio licitatório e oferecer o serviço por um preço considerado por ela mais “realista”? Este é o caso da ... no município de Timon no Maranhão.


            Cidade que fica na divisa entre o Maranhão e o Piauí, Timon teve de se contentar durante 40  anos com o monopólio de uma única empresa, que ligava o município a cidade vizinha, Teresina (capital do Piauí), na outra margem do rio. Por se tratar portanto de uma viagem interestadual (ainda que as cidades estejam mais próximas do que inúmeros bairros em uma grande cidade), as licenças de viagem devem ser emitidas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Por 4 décadas porém, isto não ocorreu.
            Cansada da espera pela licitação das linhas, a empresa ‘Timon City’, de um empresário com atuação no setor de transporte interestadual, decidiu por nas ruas 10 ônibus, assegurado por uma decisão judicial. Os ônibus, equipados com ar-condicionado e wi-fi liberado, passaram a fazer a rota, antes exclusividade de uma única empresa, por uma tarifa 20% menor, de R$ 2, contra R$ 2,50 na outra empresa, tudo para um trajeto de 20 km’s (no trajeto mais longo, de 31 km’s, a empresa cobra os mesmos R$ 2,50).
            Ônibus novos, menor tempo de espera nas paradas (onde segundo reclamações de passageiros corria-se o risco de ser assaltado), e clientes satisfeitos porém não são toda a história. A empresa enfrenta agora uma batalha judicial contra a antes monopolista ‘Dois Irmãos’, cujo dono alega “não ver sustentabilidade no negócio pelo valor praticado pela Timon”.
            Para o empresário Ramon Alves, que comanda além da Timon City, a R.A. Viagens de transporte interestadual de longas distâncias, a decisão de recorrer a justiça se deu pela demora na realização de uma licitação por parte da ANTT. Segundo o empresário, a companhia se preparou para a licitação e ao ver o caso se arrasta-se por anos, decidiu buscar amparo na justiça. A entrada de um novo concorrente no transporte da região deve levar a novas empresas especula o empresário, além de uma movimentação da prefeitura local para garantir transporte alternativo no município.
            Não apenas os empresários concorrentes parecem ter declarado guerra  como também os sindicatos. O sindicato de motoristas do Piauí alega que a empresa paga menores salários aos motoristas, enquanto a empresa se defende dizendo que seu acordo é feito no Maranhão, de modo que não cabe aos sindicalistas do outro estado definir tais normas, uma vez que os motoristas maranhenses sequer param na capital piauiense. A explicação porém parece não ter convencido, ônibus da companhia já foram apedrejados em Teresina e impedidos de rodar.


            Caso semelhante ao da cidade maranhense ocorreu em Lima capital do Peru, um dos países membro da aliança do pacífico. Assim como sua vizinha Colômbia, o Peru também enfrentava o poder dos cartéis durante ao anos 80 e 90, mas ao contrário do país vizinho, eram os serviços públicos e não o tráfico o alvo dos grupos cartelizados. Em 1991 o governo da capital peruana decidiu remover as barreiras a entrada de empresas no setor de transporte.


            Com a decisão, o número de vans e pequenos transportes se multiplicou, ampliando o acesso da população na periferia aos transportes, antes dificilmente direcionados a eles, por conta de custos excessivos para manutenção de linhas e veículos de grande porte. A exclusão da periferia do seu acesso ao transporte é uma prática comum decorrente de cartéis. Na capital paulista, o presidente do sindicato dos taxistas chocou muitas pessoas com a sinceridade ao dizer que “os pobres talvez tenham de se acostumar com o fato deque eles não terão acesso a táxis”. Semanas depois, o presidente do sindicato e o prefeito da capital estavam celebrando um acordo para criação do ‘sistema de táxis exclusivos’, o modelo citado acima e que restringe a oferta de licenças, gerando uma escassez que faz os preços serem mais caros que os táxis comuns (exatamente o oposto do Uber que se pretende imitar).
             Conluio entre empresários e políticos é uma prática comum, como demonstram inúmeros economistas ou as páginas policiais de qualquer grande jornal em circulação. Tornar claras as razões para tanto deveria ser o papel de intelectuais, das universidades e em ultima instância da mídia. A dependência do governo porém faz os alvos mudarem facilmente. O problema deixa de ser o monopólio e passa a ser a ganância. A prática da política porém, demonstra que nenhum empresário é capaz de comprar um político incapaz de lhe vender algo em troca.

Texto escrito por Felippe Hermes.



2 comentários:

  1. Excelente texto. Se a liberdade não consegue vencer no meio político, tem que se litigar na justiça, lutando uma batalha por cada vez.

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  2. Igualmente o preço do combustível no país controlado pelo governo...

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