Logo abaixo de “educação” em termos de preocupação dos
brasileiros segundo pesquisa do instituto Datafolha, “Transporte” ainda é um tema pouco debatido e em
geral dominado pelo discurso político. Enquanto 1 em cada 4 paulistanos gastam
mais de 30% do seu tempo de trabalho apenas para se locomover entre sua casa e
o local de trabalho, e mais de
R$ 100 bilhões (ou 2% do nosso PIB),
são desperdiçados apenas com tempo perdido no trânsito, o prefeito da maior
capital do país politiza o tema, e transforma a mobilidade urbana em um ‘nós contra eles’.
Ao mesmo tempo em que qualifica sua luta pessoal pela
implementação de ciclovias como uma “luta contra a barbárie”, o prefeito de São
Paulo segue fazendo pouco ou quase nada que mude as estruturas do setor de
transporte público. Sua alternativa para serviços de transporte individual como
o Uber por exemplo, é criar uma categoria especial de taxistas que utilizem
carros pretos e paguem taxas que juntas poderiam chegar a R$ 60 mil, tudo
para ofertar um serviço que funciona atualmente sendo testado e aprovado por
consumidores diariamente.
No campo do transporte coletivo, a maior cidade do país se
prepara para licitar suas linhas de ônibus, em uma operação que pode reduzir em
até 15% o número de ônibus em circulação, além de oferecer as empresas
vencedoras lucro garantido de 9,97% e R$ 7 bilhões em subsídios anualmente
para manter o preço da passagem estável. Criar e manter monopólios no setor de
transporte público porém, é uma prerrogativa de todas as prefeituras
brasileiras, não apenas da capital paulista.
Em cidades como Porto Alegre, por exemplo, que possui a
segunda tarifa mais cara do país, além de ser a única capital a contar com uma
empresa estatal de transporte, a Cia Carris, a licitação do transporte urbano esta
emperrada há 30 anos. Durante todo este período o setor se manteve como um
monopólio sem que o governo realizasse nenhum esforço para muda-lo. Preços de
tarifas são definidos em gabinetes e acatados por toda a população com o mínimo
necessário de transparência.
O transporte coletivo nas capitais brasileiras é um caso
conhecido de alinhamento entre poder político e econômico. Os reis do
transporte coletivo no país ostentam dezenas de empresas, milhares de ônibus e
um monopólio muito bem protegido pelos governos país afora. Proibir e reprimir
vans e outros meios de transporte é uma prática comum, e como na nova licitação
paulista, reduzir a oferta em um cenário de demanda constante é quase sempre a
alternativa encontrada por empresas e governos para garantir um lucro
crescente.
O resultado de tamanho descaso são as constantes reclamações
sobre o setor, do Rio Grande do Sul ao Amapá, o transporte é um problema que
afeta diariamente milhões de brasileiros, em um cenário mais visível que a má
qualidade de serviços como educação e saúde. Mas, e se uma empresa decidisse
furar este bloqueio licitatório e oferecer o serviço por um preço considerado
por ela mais “realista”? Este é o caso da ... no município de Timon no
Maranhão.
Cidade que fica na divisa entre o Maranhão e o Piauí, Timon
teve de se contentar durante 40 anos com o monopólio de uma única empresa,
que ligava o município a cidade vizinha, Teresina (capital do Piauí), na outra
margem do rio. Por se tratar portanto de uma viagem interestadual (ainda que as
cidades estejam mais próximas do que inúmeros bairros em uma grande cidade), as
licenças de viagem devem ser emitidas pela Agência Nacional de Transportes
Terrestres (ANTT). Por 4 décadas porém, isto não ocorreu.
Cansada da espera pela licitação das linhas, a empresa
‘Timon City’, de um empresário com atuação no setor de transporte
interestadual, decidiu por nas ruas 10 ônibus, assegurado por uma decisão
judicial. Os ônibus, equipados com ar-condicionado e wi-fi liberado, passaram a
fazer a rota, antes exclusividade de uma única empresa, por uma tarifa 20%
menor, de R$ 2, contra R$ 2,50 na outra empresa, tudo para um trajeto de 20
km’s (no trajeto mais longo, de 31 km’s, a empresa cobra os mesmos R$ 2,50).
Ônibus novos, menor tempo de espera nas paradas (onde
segundo reclamações de passageiros corria-se o risco de ser assaltado), e
clientes satisfeitos porém não são toda a história. A empresa enfrenta agora
uma batalha judicial contra a antes monopolista ‘Dois Irmãos’, cujo dono alega
“não ver sustentabilidade no negócio pelo valor praticado pela Timon”.
Para o empresário Ramon Alves, que comanda além da Timon
City, a R.A. Viagens de transporte interestadual de longas distâncias, a
decisão de recorrer a justiça se deu pela demora na realização de uma licitação
por parte da ANTT. Segundo o empresário, a companhia se preparou para a
licitação e ao ver o caso se arrasta-se por anos, decidiu buscar amparo na justiça.
A entrada de um novo concorrente no transporte da região deve levar a novas
empresas especula o empresário, além de uma movimentação da prefeitura local
para garantir transporte alternativo no município.
Não apenas os empresários concorrentes parecem ter declarado
guerra como também os sindicatos. O
sindicato de motoristas do Piauí alega que a empresa paga menores salários
aos motoristas, enquanto a empresa se defende dizendo que seu acordo é feito no
Maranhão, de modo que não cabe aos sindicalistas do outro estado definir tais
normas, uma vez que os motoristas maranhenses sequer param na capital
piauiense. A explicação porém parece não ter convencido, ônibus da companhia já
foram apedrejados em Teresina e impedidos de rodar.
Com a decisão, o número de vans e pequenos transportes se multiplicou, ampliando o acesso da população na periferia aos transportes,
antes dificilmente direcionados a eles, por conta de custos excessivos para
manutenção de linhas e veículos de grande porte. A exclusão da periferia do seu
acesso ao transporte é uma prática comum decorrente de cartéis. Na capital
paulista, o presidente do sindicato dos taxistas chocou muitas pessoas com a
sinceridade ao dizer que “os pobres talvez tenham de se acostumar com o fato deque eles não terão acesso a táxis”. Semanas depois, o presidente do
sindicato e o prefeito da capital estavam celebrando um acordo para criação do
‘sistema de táxis exclusivos’, o modelo citado acima e que restringe a oferta
de licenças, gerando uma escassez que faz os preços serem mais caros que os
táxis comuns (exatamente o oposto do Uber que se pretende imitar).
Texto escrito por Felippe Hermes.
Excelente texto. Se a liberdade não consegue vencer no meio político, tem que se litigar na justiça, lutando uma batalha por cada vez.
ResponderExcluirIgualmente o preço do combustível no país controlado pelo governo...
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